O estado inane da cultura, segredava-me há pouco o dedinho, bem como a ausência de políticas consequentes num domínio que é tão essencial à qualificação das pessoas como imprescindível para a compreensão crítica que as sociedades têm de si próprias, não são, consolemo-nos, exclusivo português. O presidente Nicolas Sarkozy, essa espécie de Pedro Santana Lopes a sério, como lhe chamava há dias Ricardo Pais, «s'emmerde» quando, por mera distração, entra num Teatro. Não compreende um gesto artístico que não seja motivado pela necessidade de «entreter», nem imagina uma actividade que não procure a legitimação do número. Ou que, no limite, não exalte «o sucesso, a excelência, a conquista e o domínio do mundo».
Um Presidente assim rompe um consenso que, anterior a Louis XIV, durou em França até François Miterrand. Que permitiu aquilo que em Portugal seria um paradoxo: os dois ministros da cultura mais emblemáticos do séc. XX são André Malraux, gaullista de direita, e Jack Lang, socialista de esquerda.
Mas, num país como a França, a atitude do estadista encontra uma sociedade que se lhe opõe. Ou que, pelo menos, demorará a aceitá-la.
Já entre nós, lembrou o dedinho, o desinvestimento e a desconsideração que qualquer dos nossos profundamente incultos governantes se lembre de fazer na cultura e nas artes encontra eco, não apenas popular, mas igualmente entre as «elites».
Veja-se o caso paradigmático de Pacheco Pereira, intelectual financiado pelo Estado que abomina o financiamento do estado à cultura e, portanto, se tornou no paladino de Rui Rio e da sua política populista. Veja-se o caso da reiterada proposta de «acabar de vez com o Ministério da Cultura», há tempos afirmada pelo Administrador de Serralves, Gomes de Pinho, e ontem retomada em crónica no Público pelo arquitecto Walter Rossa, emérito professor de Arquitectura na Universidade de Coimbra.
Compreendo, terminava o dedinho, que perante tanta incompetência e inutilidade se proponha acabar com a coisa, mas já ninguém se lembra da parábola do bébé e da água do banho?
3 comentários:
O discurso das trevas é como espuma, nos nossos dias. Daqui a uns tempos, só nos lembraremos do "emmerdante" Sarkozy, porque foi o presidente francês que casou com uma miúda gira que cantava umas canções.
O discurso artístico, sério, construtor, subsidiodependente, independente… estará vivo na memória dos que vão cultivando o nobre ofício de ser público(s).
Ainda bem que há um dedinho, "raivoso", sempre atento.
Resta-nos o rapaz dos futebois, no lado de lá do continente, para o salvar o(s) teatro(s) da europa…
sem "o", antes de salvar!
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